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ReporQuem nunca ouviu falar de Vadinho, personagem marcante em Dona Flor e seus dois maridos (1966), que morre em pleno carnaval. Se a comida podia faltar no velório, a ausência da cachaça era “desconsideração ao falecido”. Mas foi Quincas Berro D’Água (1959), um excelente bebedor e conhecedor de cachaças, que imortalizou a imagem do boêmio errante ao se servir de uma garrafa transbordando e ecoar o berro da decepção: “Áááááguuuuua!”.
Nesse universo dos romances, onde elementos da realidade cotidiana se misturam com outros folclóricos, oníricos e míticos, rompendo a linearidade temporal e a racionalidade, surge o curso Jorge Amado e a Cachaça: entre Exu e Iemanjá, ministrado pelo professor e doutor em literatura francesa da Universidade de São Paulo (USP), e cachaceiro dedicado, Maurício Ayer.
Serão três encontros totalmente online, nos quais a obra do escritor afeito e devoto dos costumes e tradições que formam o povo brasileiro será analisada buscando os sentidos da cachaça no regionalismo baiano. O curso é indicado para todos os apreciadores de cultura, literatura e cachaça.
O conteúdo e as descobertas extraídas das pesquisas de Maurício, longamente maturadas, são servidas numa degustação intensa, em que ele expõe análises aveludadas e de sabores persistentes, nos encontros online (em função da pandemia) ao som do violão e, claro, regados a boas cachaças.
No repertório, já está confirmada a canção praieira “É doce morrer no mar”, composta numa parceria entre Dorival Caymmi e Jorge Amado, a partir de um trecho do livro “Mar Morto”. Músicas de Tom Jobim e Chico Buarque também vão blendar esse mergulho literário. O próprio clássico “Mar Morto” (1936) com a rica mitologia em torno de Iemanjá e, ainda, “Tenda dos Milagres” (1969) que enaltece a mestiçagem, a tradição popular e a cultura negra completam a lista.
Essa é a segunda vez que Jorge Amado, nome tão importante da literatura brasileira e terceiro autor de língua portuguesa mais lido do mundo, tem sua obra abordada por Maurício num curso. O professor diz que encontrou uma densidade pouco reconhecida do escritor baiano, que é visto por muitos, apenas, como um grande contador de histórias. “Além dessa cosmologia dos orixás, presente nas obras de Jorge Amado, existem outras referências que permitem falar de um sincretismo cultural muito amalgamado”, resume.
A máxima de que um livro nunca acaba de ser lido, mesmo ao término de suas páginas, é levada ao pé da letra por Maurício. A biblioteca que serve de cenário para os encontros virtuais que o diga. Há seis anos, o professor tem se dedicado a mapear a cachaça no universo da literatura, revisitando escritores e depois ampliando a busca, também, para a música brasileira.
“Mesmo quando as folhas terminam, um livro nunca acaba de ser lido”
Maurício Ayer
O projeto Literatura Brasileira & Cachaça que teve início em 2014, já visitou e bebeu da obra de grandes escritores como José Lins do Rego, Graciliano Ramos, João Cabral de Melo Neto, Guimarães Rosa, Mário de Andrade, Antonio Callado e Cecília Meireles, além de cancionistas como Chico Buarque, Aldir Blanc, Ary Barroso, Cartola, Luiz Gonzaga, Tom Jobim e outros.
Numa entrevista, concedida em julho ao Mapa da Cachaça, Maurício falou um pouco sobre o papel da literatura como instrumento de compreensão da cachaça na cultura brasileira. Veja aqui.
Ele classifica os escritores e compositores em dois tipos, sem perder de vista a temática etílica: são fermentadores e destiladores. Os primeiros retratam a sociedade e contam histórias, enquanto os outros vão além, extraindo a quintessência (ou grau mais elevado de algo), chegando ao campo dos significados. Jorge Amado é ao mesmo tempo fermentador e destilador.
Imortalizado pela Academia Brasileira de Letras, o escritor que morreu em 2001, deu voz aos excluídos e marginalizados, sendo um dos primeiros a escrever sobre os trabalhadores do mar e os costumes do porto, e traçar um retrato fiel da perseguição e intolerância religiosa no país.
Da ficção à realidade, como deputado federal, Jorge Amado foi o autor da lei que trata do livre exercício da crença religiosa no Brasil. E escolheu Exu, o orixá do marafo (bebedor de cachaça) e da comunicação entre deuses e homens, como o guardião da Fundação que leva o próprio nome.
Aprofundar e discutir a obra de Amado a partir da pesquisa de Maurício reserva, com certeza, novas interpretações e construtivas surpresas sobre a cachaça na literatura e história. Detalhes que antes podem ter passado despercebidos numa leitura normal, devem saltar aos olhos, mostrando uma grande teia cultural interconectada. Maurício não esconde que a cachaça tem ajudado (e muito) no processo, sendo, talvez, a grande responsável por ampliar o olhar do pesquisador.
Curso 100% online: Jorge Amado e a Cachaça: entre Exu e Iemanjá
Prof. Dr. Maurício Ayer (FFLCH/USP)
Datas: 24, 26 e 27 de novembro, das 20h às 22h
Carga horária: 6 horas
Investimento: R$88 (meia) e R$176 (inteira)
Inscrições: aqui
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