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ResetMariana Jorge é uma designer apaixonada por tudo aquilo que envolve a cultura popular brasileira e a filosofia. Daí, então, nasceu a vontade de unir a profissão à cachaça. Depois de uma visita ao Restaurante Mocotó, em São Paulo, ela passou a se aprofundar no estudo sobre os rótulos de cachaça. Que histórias eles contam para a gente? Quem são os designers populares que fazem esses rótulos desde o século XIX? Há uma recente profissionalização do setor? Confira!
Sou designer e me interesso por embalagens desde que me entendo por gente. Comecei a me aprofundar em rótulos de cachaça a partir do meu envolvimento com a bebida, que aconteceu há uns 3 anos, durante uma visita ao restaurante Mocotó. Por lá comecei a entender a cachaça como parte de um design vernacular brasileiro.
A expressão Design Vernacular é frequentemente usada para descrever uma forma não acadêmica de design. São projetos executados com materiais locais e do cotidiano e indicam forte ligação com a cultura local.
A cachaça tem uma particularidade interessante que a insere no universo vernacular: as milhares de marcas produzidas no Brasil são, em sua maior parte, alambiques familiares. Empresas sem estrutura profissionalizada. Isso resulta em criações feitas por membros da família ou profissionais de gráficas regionais.
Apesar de a cachaça ser um produto tão antigo, acredito que os primeiros rótulos da bebida como conhecemos tenham sido criados a partir da chegada das primeiras oficinas de litogravura no século 19. Esta técnica de impressão foi a primeira que garantia a possibilidade de combinar texto com imagens em uma gama de cores sólidas. Esta versatilidade veio ao encontro das demandas do comércio.
Segundo o historiador Rafael Cardoso, em seu livro “O design antes do design”, era um momento no qual as artes eruditas estavam relacionadas ao comércio: os mitos clássicos, a arquitetura urbana neoclássica, a pintura acadêmica, deuses greco-romanos, personagens religiosos… Todos faziam parte do repertório visual e cultural de comerciantes e consumidos brasileiros do século 19.
No caso de rótulos de cachaça que não tem produção em larga escala, desde essa época até pouco tempo a criação de rótulos poderia ficar a cargo de um ilustrador, de um litógrafo ou do próprio produtor.
Sim, há uma grande e fascinante particularidade do design de cachaça em relação às outras bebidas: a liberdade criativa e temática ao redor da cachaça é imensa! Apesar de um produto tão antigo quanto à nação, ainda estamos abertos para a construção de uma identidade de produto “tudo a ver” com nossa própria identidade nacional: livre, criativa, diversa.
Na minha opinião, esta é uma questão que mereceria maior atenção dos produtores porque reflete a total falta de articulação entre eles, além da falta de incentivo e atenção da esfera pública. A maior parte das bebidas possui uma identidade forte em relação ao design da forma das garrafas. Esta diferença ajuda o consumidor a entender que tipo de bebida está comprando. No caso da cachaça, merecia uma padronização. Existe, inclusive, uma garrafa que é amplamente adotada por alguns alambiques, mas a fabricação não consegue garantir a constância de produção. Por isso muitos produtores acabam abandonando esta forma e utilizando a garrafa de cerveja.
Essa informalidade e variedade estão ligadas ao que falamos sobre o design vernacular, sobre os alambiques serem, em sua maioria, um negócio familiar, espalhado por todo o Brasil. Cada região possui um conjunto de temas comuns, relacionados à sua cultura podemos observar algumas diferenças nas cachaças produzidas no Sul, no Nordeste, no Centro-Oeste etc.
Vejo muitas marcas contratando designers para a criação de seus rótulos. Muitos destes profissionais utilizam as referências temáticas históricas de cachaça dando um aspecto contemporâneo. A meu ver está nascendo uma linguagem bastante interessante em rótulos recentes, que bebe da fonte da cultura popular brasileira, mas lhe oferece um olhar contemporâneo e antenado.
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